Então, por que usar lúpulo na cerveja?
Bem… pra começar porque é lei.
De acordo com o art. 36. do Decreto N° 6.871, de 4 de junho de 2009, que regulamenta a Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a padronização, classificação, registro, inspeção, produção e fiscalização de bebidas, a cerveja é a bebida obtida pela fermentação alcoólica do mosto cervejeiro oriundo do malte de cevada e água potável, por ação da levedura, com adição de lúpulo.
Resumindo: no Brasil só é cerveja se tiver lúpulo!
Mas, e na prática, por que usar o lúpulo?
O lúpulo é um conservante natural, pois é carregado de alfa-ácidos (têm uma leve efeito antibiótico/bacteriostático contra bactérias Gram-positiva e favorece a atividade exclusiva da levedura durante a fermentação da cerveja).
Só isso já explica muita coisa.
Antigamente era adicionado diretamente ao barril de cerveja após a fermentação para mantê-la fresca enquanto era transportada. Inclusive foi assim que o estilo India Pale Ale surgiu!
Essa você já sabia, certo?
Mas não custa relembrar que foi na virada do século XVIII, quando cervejeiros britânicos começaram a enviar cerveja para as tropas alocadas na Índia. Essa cerveja estava armazenada em barris e era bastante lupulada para que se conservasse durante a viagem que durava de 3 a 6 meses até chegar à Índia. No final da viagem, a cerveja acabava ganhando grande intensidade em aroma e sabor de lúpulo.
E como chegou-se a essa conclusão? Santa Hildegard!
Hildegard von Bingen (1098-1179) foi uma monja beneditina alemã, mística, teóloga, pregadora, naturalista e dramaturga que também foi poetisa e compositora, tendo como legado uma extensa lista de manuscritos relacionados a todos estes assuntos.
Existem registros seus relacionados ao lúpulo e à cerveja que datam por volta de 1153 d.C., onde ela diz “putredines prohibet in amaritudine sua” (seu amargor evita a deterioração).
Por outro lado, a primeira citação do uso do lúpulo na elaboração de cervejas é encontrada na epopeia finlandesa Kalevala, que data do século 19. Entretanto, ela remonta períodos anteriores a 1000 a.C. Apenas a compilação dos poemas ocorreu posteriormente, o que faz com que alguns pesquisadores não considerem como sendo a primeira referência do uso do lúpulo.
Enfim, amargou-se a cerveja!
Os óleos essenciais do lúpulo são altamente voláteis e são os responsáveis pelo aroma da cerveja (floral, cítrico, terroso, resinoso, picante…). Também podem contribuir para o seu sabor. Ainda sobre sua constituição, são as resinas, os alfa-ácidos encontrados ali, que conferem o amargor da bebida.
Mas você pode escolher qual perfil sensorial – e sua intensidade – que quer que o lúpulo imprima em sua cerveja.
Como?
Em primeiro lugar é preciso conhecer as variedades e escolher a que esteja de acordo com as características que você deseja. Se quiser bastante amargor, lúpulos com grande quantidade de alfa-ácidos (Chinook, Herkules, Millenium, Target…), se quiser mais aroma, deve ter bastante óleos essenciais (Centennial, Cascade, Saaz, Fuggle…).
Regra de ouro no uso do lúpulo
Mas além dos tipos e características, existe uma regrinha de ouro: quanto mais tempo o lúpulo fica na fervura, mais amargor ele agrega.
Adiciona-se no início da fervura (é normalmente acrescentado quando faltam uns 60 minutos ou um pouco mais para o final dessa etapa). Isso ocorre porque em estado natural, os alfa-ácidos do lúpulo (responsáveis pelo amargor) não se dissolvem na água, mas quando fervidos, eles sofrem uma reação conhecida como isomerização, transformando-se em iso-alfa-ácidos, solúveis em água. E, nesses casos, as demais características do lúpulo são volatilizadas durante a fervura.
Já quando o que você quer é sabor, o lúpulo deve ser adicionado quando faltam entre 30 e 15 minutos para o final da fervura. E, para conseguir uma cerveja bem aromática, você deve jogar o lúpulo bem perto do final da fervura (faltando 5 ou, no máximo, 10 minutos), para que os óleos não evaporem totalmente.
Mas para conseguir ainda mais aroma, você pode lançar mão do dry hopping, que é quando o lúpulo é adicionado na etapa fria da produção, durante a maturação.
Essa técnica concentra os óleos essenciais na cerveja.
Igualmente, é interessante saber que, nessa etapa, as leveduras já consumiram todos (ou quase todos) os açúcares, a cerveja tem o pH baixo e praticamente o seu teor máximo de álcool. Associando isso às propriedades bacteriostáticas do lúpulo, entende-se que foi criado um ambiente bastante hostil para quaisquer agentes contaminantes.
Sensacional, hein?
Agora que você, hophead, já sabe por que o lúpulo é tão importante na panela e no copo, como vai escolher sua lupulagem?
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