Quando se trata em armazenar lúpulo, surgem inúmeros questionamentos a respeito de variáveis que influenciam. Como por exemplo, temperatura, presença de oxigênio, tipo de processamento do lúpulo, enfim…
Abordaremos neste texto a influência de alguns destes fatores quando armazenamos o lúpulo em casa ou em uma cervejaria.
As condições de armazenamento do lúpulo desempenham um papel importante na manutenção da integridade dos produtos de lúpulo durante o processamento, transporte e armazenamento, e sua qualidade final quando usadas na fabricação de cerveja.
Inúmeros cientistas estudam há anos a química do envelhecimento do lúpulo, além de buscar formas para minimizar a degradação, afinal de contas. Boas cervejas exigem ingredientes bons…
O que é evidente, é que a velocidade do envelhecimento do lúpulo muda de acordo com a variedade utilizada.
A taxa de envelhecimento para uma variedade particular é medida utilizado o índice de guarda do lúpulo (Hop Storage Index – HSI), desenvolvido em 1979 por Nickersen e Likens e representa a quantidade de alfa ácidos que potencialmente serão perdidos no período de 6 meses, quando o lúpulo é armazenado a uma temperatura constante de 20°C (TEDONE et al., 2020)
É a razão de absorbância a 275 nm e absorbância a 325 nm de um extrato de tolueno obtido a partir do lúpulo seco em uma solução alcalina de metanol. A teoria por trás do HSI envolve os espectros de produtos de oxigenação formados naturalmente.
Como exemplo, pode-se verificar um lúpulo que tenha 10% de alfa-ácidos e um HSI de 0,35 (35%). Isto significa que, após 6 meses, o teor de alfa-ácido esperado para este lúpulo será de 6,5%. O lúpulo pode durar até 3x mais que o seu HSI se estiverem armazenados de maneira adequada.
Como o próprio nome diz, é um índice apenas. Serve apenas para indicar uma tendência de envelhecimento. Na prática, sabemos que a velocidade da degradação dos compostos é levemente mais rápida do que mencionado nas análises de HSI.
Recentemente, os estudos estão sendo convergidos para o foco no comportamento dos polifenóis durante o envelhecimento do lúpulo. Mas isto deixamos para um papo futuro…
Deve-se reconhecer que, durante o “armazenamento”, conforme definimos aqui, é provável que haja vários processos agindo sobre a química do lúpulo. Haverá volatilização, oxidação (modificação, degradação ou polimerização) e possivelmente alterações enzimáticas.
As relações entre a degradação das resinas macias do lúpulo e as mudanças nos óleos essenciais do lúpulo foram demonstradas em estudos antigos. Porém, o efeito da oxidação nas propriedades organolépticas do lúpulo usado para adição de aroma ou sabor ainda não está claramente entendido.
Com a atual tecnologia na forma de embalagem do lúpulo, utilizando embalagens que promovem uma barreira à luz e atmosfera inerte (CO2 ou N2), além do transporte em cadeia refrigerada, podem diminuir consideravelmente a degradação oxidativa dos compostos do lúpulo.
Mas vejam bem, eu mencionei que “podem diminuir” a degradação, visto que são reações química inevitáveis. Por este motivo, o conhecimento da vulnerabilidade oxidativa pode permitir que os produtores otimizem a colheita, as condições do forno e o processamento pós-colheita, objetivando fornecer lúpulo aos cervejeiros com a mais alta qualidade possível.
A química do envelhecimento do lúpulo
Um estudo feito por Laura Tedone e seus colaboradores, mostra justamente alguns fatores importantes para observarmos quando se trata de envelhecimento do lúpulo. No estudo, ela analisou três amostras de lúpulo em cones e em pellets (Cascade, Vic. Secret e Galaxy) (TEDONE et al., 2020)
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As amostras foram expostas ao oxigênio, temperatura e umidade ambiente variável, mas não expostas à luz. Uma amostra de cada variedade e tipo de produto foi mantida na embalagem original desde o início e usada como referência. O experimento foi executado no período de 16 de setembro de 2015 a 16 de outubro de 2015.
Como resultado dos testes, observaram claramente que altos valores de HSI podem estar diretamente relacionados ao número de dias que o lúpulo passou exposto a temperaturas relativamente altas. Houve um aumento constante do HSI nos cones e pellets das três cultivares ao longo do experimento. Como esperado, esse aumento no HSI correspondeu a um declínio na concentração de alfa-ácido. Há fortes evidências de que cada variedade de lúpulo se comporta de maneira distinta na química do envelhecimento.
A concentração de compostos provenientes de reações oxidativas do ácido alfa se mostraram maiores no lúpulo Galaxy, comparando com Cascade e Vic Secret. Além disso, os betas ácidos são menos estáveis nas amostras de Galaxy do que nas outras variedades. Um ponto interessante mostra que o teor de umidade pode ter um efeito negativo na estabilidade do armazenamento do lúpulo, particularmente na degradação dos ácidos alfa (e beta).
As oxidações dos lúpulos em flor foram consideravelmente mais lentas, quando comparados com pellets. Isso se deve, principalmente a exposição maior que a lupulina sofre ao oxigênio. Visto que o processo de pelletização torna a superfície de contato da lupulina maior, catalisando as reações de oxidação.
As alterações nos óleos essenciais foram muito mais significativas, em aproximadamente 30 dias dos lúpulos expostos ao oxigênio e condicionado em temperaturas baixas.
O lúpulo Vic Secret pareceu perder uma proporção maior de óleos essenciais do que Cascade e Galaxy. Mesmo que existam algumas diferenças entre as formas de processamento entre os lúpulos estudados no trabalho, é evidente que todas as três variedades mostraram um declínio preocupante na concentração de óleos essenciais.
Este fato pode ser decisivo se o cervejeiro utilizar como forma de calcular a quantidade de lúpulo utilizado no Dry Hopping baseado na análise dimensional de mL de óleos essenciais por litro de cerveja.
Analisando mais a fundo este tema, alguns estudos mostram que o óleo essencial Mirceno pode ser considerado um marcador-chave indicador de “frescor” de lúpulo. Mesmo que o processo de pelletização degrada e oxida o Mirceno, as análises foram feitas justamente depois do processamento do lúpulo e mostram uma queda considerável na concentração de mirceno ao longo do tempo, e um aumento na concentração de hidrocarbonetos oxigenados, como o Linalol, que pode ser considerado o produto da oxidação do Mirceno (CEOLA et al., 2019).
Obviamente não é apenas o Mirceno que tem a característica de degradar, alguns outros hidrocarbonetos monoterpenos e sesquiterpenos também mostram esse comportamento.
Ou seja, condições inadequadas de armazenamento do lúpulo, mesmo por um período relativamente curto a temperaturas amenas, afetam a composição dos ácidos alfa e beta, bem como o conteúdo e a qualidade da fração volátil (óleos essenciais).
Visto isso, inevitavelmente a temperatura influencia na degradação e oxidação dos compostos do lúpulo, mas mesmo que você guarde seus lúpulos em temperaturas extremamente baixas (o que é recomendado), é importante “trocar” a atmosfera da embalagem. Para isso, purgas com CO2, por exemplo, são bem-vindas. 😉
Referências:
CEOLA, D. et al. Headspace‐solid phase microextraction and GC‐MS followed by multivariate data analysis to study the effect of hop processing type and dry hopping time on the aromatic profile of top‐fermented beers. Separation Science Plus, v. 2, n. 7, p. 245–252, 2019.
TEDONE, L. et al. Hop (Humulus lupulus L.) Volatiles Variation During Storage. Journal of the American Society of Brewing Chemists, v. 78, n. 2, p. 114–125, 2020.
Por Duan Ceola, professor da Escola Superior de Cerveja e Malte, licenciado em Química pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), pesquisador e mestrando em Química Analítica na UDESC com projetos de pesquisa relacionados aos lúpulos nacionais.
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