Por Duan Ceola, químico, sommelier de cerveja, pesquisador e mestrando em Química Analítica com projetos de pesquisa relacionados aos lúpulos nacionais, coordenado e, professor na Escola Superior de Cerveja e Malte.
O lúpulo, Humulus lupulus, contém dois grandes grupos de ácidos orgânicos, humulonas, também conhecidos como ácidos alfa, e lupulonas, conhecidos como ácidos beta. Esses dois ácidos orgânicos são compostos por uma mistura de três grandes homólogos referidos como co-, n- e ad-. Há também três homólogos menores conhecidos como pós, pré e adpre-, no entanto, esses homólogos de ácido lúpulo são encontrados em lúpulo seco em concentrações muito baixas, geralmente menos de 0,2%. Recentemente, foi relatado a descoberta de um quarto homólogo para ácidos alfa e beta encontrados no lúpulo chamado aceto-.
O lúpulo desempenha um papel importante na fabricação de cerveja, contribuindo com amargura, aroma, espuma, ação antibacteriano e antioxidante para a cerveja. Os cervejeiros estão principalmente interessados em ácidos alfa, uma vez que ele isomeriza termicamente em ácidos iso alfa quando submetidos a temperaturas acima de 70°C e é a principal substância amarga na cerveja. Embora os beta ácidos sejam os mais antibacterianos de todos os ácidos de lúpulo, eles normalmente não são encontrados na maioria das cervejas devido à sua não polaridade e baixa solubilidade na cerveja.
Embora os cervejeiros soubessem há séculos que o lúpulo contribuiu com amargor à cerveja, foi em 1953 que Rigby e Bethune descobriram e provaram que os ácidos alfa então isomerizam em ácidos iso alfa e que os ácidos iso alfa são os principais responsáveis pelo amargor da cerveja. Eles também identificaram corretamente a estrutura molecular dos três principais homólogos, co-, n- e ad-. Alguns anos depois, em 1958, Verzele contribuiu para a ciência da composição do lúpulo descobrindo congêneres de menor concentração, descritos como pós-. Em 1962, Rillaers e Verzele descobriram outro novo ácido alfa menor, pre-. Décadas depois, em 2004, Zhang identificou um novo ácido alfa e beta nomeados de adprehumulona e adprelupona. Relato neste artigo, a descoberta de um novo ácido alfa e beta ácido encontrados no lúpulo chamado acetohumulona e acetolupulona.
A Figura 1 mostra a estrutura molecular de todos os ácidos alfa e beta ácidos conhecidos até o momento.
Figura 1: Congêneres químicos das moléculas de alfa e beta ácidos.
O que diferencia os homólogos de ácidos alfa e ácidos beta é o grupo acilo ou cadeia lateral R. Existem evidências que propõem que o grupo acilo seja derivado de aminoácidos hidrofóbicos, porém necessitam de mais estudos para confirmar esta teoria. O aminoácido leucina pode explicar a cadeia lateral isobutila encontrada nas humulona e lupulona, valina para a cadeia lateral isopropil para cohumulona e colupulona, e iso-leucina para a cadeia lateral sec-butílica para adhumulona e adlupulona.
Além disso, o aminoácido alanina pode explicar as cadeias laterais para aceto humulona e aceto lupulona. No entanto, não há aminoácidos codificadores ou proteinogênicos que possam explicar os congêneres (gêneros da mesma espécie química) da cadeia lateral para os alfa e beta ácidos. Desta forma, outro mecanismo é mais provável, ou essas cadeias laterais vêm de aminoácidos não codificantes ou não proteinogênicos, porém deixamos este tema para um próximo artigo.
É importante notar que as cadeias laterais, R, são formadas durante os estágios iniciais da biossíntese e antes da última etapa, oxidação (que forma ácidos alfa) ou uma reação chamada de prenilação (que forma ácidos beta). Portanto, se alguém descobrir um novo homólogo para ácidos alfa, deve haver um homólogo correspondente para ácidos beta e vice-versa.
Para a descoberta destas duas novas moléculas, foi utilizado a Cromatografia Líquida de Alta Eficiência, que consiste basicamente em uma análise quantitativa na forma de Cromatografia em Coluna que bombeia uma mistura de amostra ou analito em um sistema de solvente comumente conhecido como Fase Móvel no fluxo especificado através de uma Coluna que contém a Fase Estacionária. A separação do Analito acontece com base na interação do Analito com a Fase Móvel e a Fase Estacionária. O HPLC usado na descoberta tem um detector de matriz de diodos, que permite olhar para os espectros UV de cada pico (correspondente a uma molécula). Após a evidência destas duas novas moléculas, é necessário confirmar a presença e estabilidade delas, para isso foi estudada a estrutura molecular da aceto humulona e aceto lupulona, conforme trabalho relacionado a patente de Sigg-Grutter e Wild.
Esta descoberta não é nenhuma novidade no meio científico e pesquisas aplicadas a lúpulo. Em 1985, Mizobuchi e Sato já haviam fornecidos informações convictas de que essas duas moléculas novas pudessem existir, porém, as tecnologias da época eram rudimentares para caracterizar e quantificar com detalhes as duas moléculas novas. Além disso, a descoberta não causa impacto significativo para o sensorial da cerveja, tampouco para as características de composição química do lúpulo, pois, ambas as moléculas estão presentes em quantidades extremamente pequenas.
Acredito que este trabalho foi extremamente importante para a comunidade científica, evidenciando a necessidade de explorar cada dia mais o lúpulo. Os avanços tecnológicos também ajudaram para a descoberta, e o que veremos pela frente será a descoberta e caracterização de mais moléculas. O impacto disso vai além da produção de cerveja e utilização do lúpulo, está ligado diretamente a ciência aplicada ao lúpulo.
LEKER, Jeremy; MAYE, John Paul. Discovery of Acetohumulone and Acetolupulone a New Hop Alpha Acid and Beta Acid. Journal Of The American Society Of Brewing Chemists, [S.L.], p. 1-6, 23 jun. 2022. Informa UK Limited. DOI: 10.1080/03610470.2022.2079944.
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